eu sei que traí, mãe.
Tudo porque já não sou
o menino adormecido no fundo dos teus olhos.
Porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas
talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa:
esqueceste que as minhas pernas cresceram
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me -
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal...
Mas - tu sabes - a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura
dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim
e deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves."
Eugénio de Andrade
(óleo sobre tela de Arlete Salgado - minha querida mãe, 2004)
18 comentários:
muito bom!
aconselho-a a visitar
blogdozelio.blogspot.com,
embora não sendo o meu espaço,
é de alguém que conheço bem,
e gostei da ilustração que fez a este poema do eugénio. boa semana!
.
Olá Benjamina,
Um poema maravilhoso de Eugénio de Andrade, enquadrado aqui de forma superior.
Beijinho:))
Que belíssima ideia a de ilustrar o poema - lindo - com este quadro!
Im beijinho
Alda
Olá Benjamina,
Tem andado perdida no espaço sideral? Desejo que não sejam problemas.
Gosto muito deste poema, está muito sincero, muito sentido...aliás é recorrente a ideia, que ficamos sempre aquem das expectivas.
Bjs,
Manuela
Otário
Obrigada pelo comentário e pelo conselho. Visitei e gostei muito.
Boa semana para si também
Olá Josefa
Obrigada e um beijinho :)
Olá D. Alda
Ainda bem que gostou da "ilustração" do poema. Bonito quadro mesmo!
Beijinhos
Olá Manuela
Se calhar ando só um bocadinho perdida no espaço sideral :) o que me deixa pouco tempo para a blogosfera, com pena minha :(
Este poema é lindíssimo, e concordo, muito sentido também.
Beijinhos
Benjamina,
É daqueles que arrepia de tão belo e tão sentido.
Para mim chegam-me as frases finais:
"Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim
e deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves."
Obrigado!
O abraço de sempre.
Belíssimo poema e muito bem escolhido para o Dia da Mãe.
Miguel e Eduardo
Belíssimo mesmo. Do princípio ao fim. O Eugénio era um Génio.
Um abraço
Belíssimo!
Eu também vou com as aves...
O amor à Mãe inspira a criação de poemas como este: magnificos.
Beijinho.
Olá Teresa
É verdade! A quem devemos o saber amar?
Este poema do Eugénio de Andrade é mesmo magniífico!
Beijinhos
Boa noite,
antes de me alongar quero agradecer a simpática visita ao meu blogue no seu 2º aniversário.
E agora embora atrasada porque o dia já passou, devo dizer-lhe que este poema de Eugénio de Andrade é um dos poemas à Mãe mais lindos que li.
Atrasada... Talvez não, porque na verdade dia da Mãe, do Pai e dos Filhos são todos os dias, pelo menos nas famílias em que há respeito e amor.
Beijinhos,
Ana Martins
Un bello poema y un cuadro que transmite un muy dulce sentimiento. Muy buena entrada. Un abrazo.
Olá Ana
Concordo que dia da mãe é todos os dias!
A minha mãe nunca se adaptou lá muito bem ao novo dia da mãe - para ela, o dia da mãe era o dia do seu aniversário, mas nós nunca ligamos, pois quantos mais dias da mãe, melhor :)
Em muitos países o dia da mãe é amanhã - segundo domingo de Maio (http://en.wikipedia.org/wiki/Mother%27s_Day) - por isso, de modo nenhum está atrasada :)
Beijinhos
Olá Cris
Tenho muito orgulho na minha Mãe e nos quadros que ela pinta. E este é um dos meus favoritos!
Obrigada e beijos
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