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e eram florestas sobre florestas escritas.
O canto cantava: era o incêndio do vento
folheando a memória da terra
essa maranha de raízes aéreas que nasciam enterrando
mais fundo as árvores anteriores;
essa teia nocturna de troncos e lianas, de ramos e folhas,
nervuras que os versos enervam irrespiráveis;
esse mapa em relevo lavrado pela paciência da luz
que atrasando-se recorta
estas estranhas esculturas do tempo:
os poemas selvagens
o máximo excesso de uma rosa aquática e frágil
sempre a nascer desfiladeiros
e falésias, fendas, quebradas, ravinas
vulcões que deflagram em écrans sucessivos
Havia séculos
e o cinema dos astros
acendia ampolas e bagas, campânulas, cápsulas, lâmpadas;
punha em música a infinita noite dos versos que longamente
escutam
aqueles que muito antes ou muito depois vieram ou virão
até estes anfiteatros que os desertos invadem.
Havia séculos
e
atravessando as ruínas dessa terra quente, as páginas
de água dessa rosa alucinada
havia esse:
o comum de nós que dos seus se dividindo, verso
a verso, procura ainda alguém. E assim
era de novo o início.
A grande migração das imagens — havia séculos —
desde há muito começara, desde sempre, já.
E sem cessar migrávamos nós, inquietos e perdidos
sem paz e sem lei, sem amos nem destino."
Manuel Gusmão, em Migrações do Fogo, Editorial Caminho, Lisboa, 2004, obtido daqui
O poeta e ensaísta Manuel Gusmão venceu o Prémio de Ensaio Eduardo Prado Coelho, criado pela Associação Portuguesa de Escritores (APE) e Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, pela obra Tatuagem Palimpsesto. O prémio é entregue no dia 29 de Abril em Vila Nova de Famalicão.
1 comentário:
Benjamina,
Passo para desejar uma Feliz Páscoa!
Beijos!
Alcides
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