Bernardo Soares / Fernando Pessoa, em "Livro do Desassossego"
31 de dezembro de 2009
No crepúsculo
Bernardo Soares / Fernando Pessoa, em "Livro do Desassossego"
30 de dezembro de 2009
Antes de findar o ano...
- "1984", de Aldous Huxley
- "A Agustina", de Sibila Bessa-Luís
- "As Aventuras de João Com Medo", de José Gomes Ferreira
- "O Admirável Mundo Novo", de George Orwell
- "Os Queirós" de Eça da Maia
- "A Cólera em Tempos de Amor", de Gabriel Garcia Marquez
- "As Grandes Memórias", de José Saramago
- "Voltaire", de Cândido
- "Memória de Peixe", de António Lobo Antunes
- "Doutor Boris", de Jivago Pasternak
Bom, demorou, mas lá vai:
Eu já tive (e tenho) a suprema e tripla felicidade de ser mãe
Eu sei que mais dia menos dia os meus filhos voarão do ninho
Eu quero mais é que eles sejam felizes e que dêem valor ao essencial da vida e que não é visível aos olhos
Eu sonho que cada geração seja muito melhor que a anterior para os outros e para a natureza.
Quero também aqui agradecer o selo "Não faço parte do problema. Faço parte da solução!"
E à o meu muito obrigada pelo selo "esse blog é VIP"
Quero, no entanto, deixar aqui um agradecimento especial a todos os que me fizeram companhia visitando este blogue neste seu meio ano de existência , dando-se ao trabalho de deixar um comentário. A todos dedico o selo amizade (sim, esse aí ao lado esquerdo com as flores e borboleta) e aceitem também os outros selos ou desafios que menciono neste "post" se assim o entenderem, pois certamente os merecem muito mais que eu.
27 de dezembro de 2009
24 de dezembro de 2009
Feliz Natal mesmo para quem não sabe que é Natal
Com os desejos de um bom Natal, mesmo para quem não sabe que é Natal ou o que é o Natal, deixo um vídeo que todos conhecem, e que já tem 25 anos.
E um Postal de Natal 2009, uma versão de David Fonseca de uma música dos Wham, também muito conhecida, dos anos 80 - Last Christmas.
22 de dezembro de 2009
20 de dezembro de 2009
Dia Internacional da Solidariedade
19 de dezembro de 2009
É preciso não esquecer nada
nem a torneira aberta nem o fogo aceso,
nem o sorriso para os infelizes
nem a oração de cada instante.
É preciso não esquecer de ver a nova borboleta
nem o céu de sempre.
O que é preciso é esquecer o nosso rosto,
o nosso nome, o som da nossa voz, o ritmo do nosso pulso.
O que é preciso esquecer é o dia carregado de atos,
a idéia de recompensa e de glória.
O que é preciso é ser como se já não fôssemos,
vigiados pelos próprios olhos
severos conosco, pois o resto não nos pertence."
Cecília Meireles
16 de dezembro de 2009
13 de dezembro de 2009
10 de dezembro de 2009
Dia dos Direitos Humanos 2009
9 de dezembro de 2009
One World
6 de dezembro de 2009
Era um pássaro alto
e que devorava o azul
como nós devoramos o nosso amor.
Era a sombra de uma mão sozinha
num espaço impossivelmente vasto
perdido na sua própria extensão.
Era a chegada de uma muito longa viagem
diante de uma porta de sal
dentro de um pequeno diamante.
Era um arranha-céus
regressado do fundo do mar.
Era um mar em forma de serpente
dentro da sombra de um lírio.
Era a areia e o vento
como escravos
atados por dentro ao azul do luar.
Pintura também de Cruzeiro Seixas, sem título, 1970 (daqui)
3 de dezembro de 2009
Chorando
30 de novembro de 2009
Não sei o que é o tempo
Emaranha-se-me a consciência se penso nestas coisas. Pressinto um erro em tudo isto; não sei, porém, de que lado está. É como se assistisse a uma sorte de prestidigitação, onde, por ser tal, me soubesse enganado, porém não concebesse qual a técnica, ou a mecânica, do engano.
Chegam-me, então, pensamentos absurdos, que não consigo todavia repelir como absurdos de todo. Penso se um homem que medita devagar dentro de um carro que segue depressa está indo depressa ou devagar. Penso se serão iguais as velocidades idênticas com que caem no mar o suicida e o que se desequilibrou na esplanada. Penso se são realmente sincrónicos os movimentos, que ocupam o mesmo tempo, em os quais fumo um cigarro, escrevo este trecho e penso obscuramente.
De duas rodas no mesmo eixo podemos pensar que há sempre uma que estará mais adiante, ainda que seja fracções de milímetro. Um microscópio exageraria este deslocamento até o tornar quase inacreditável, impossível se não fosse real. E por que não há o microscópio de ter razão contra a má vista? São considerações inúteis? Bem o sei. São ilusões da consideração? Concedo. Que coisa, porém, é esta que nos mede sem medida e nos mata sem ser? E é nestes momentos, em que nem sei se o tempo existe, que o sinto como uma pessoa, e tenho vontade de dormir."
Bernardo Soares / Fernando Pessoa, em "Livro do Desassossego"
28 de novembro de 2009
Cat Piano
The Cat Piano from PRA on Vimeo.
25 de novembro de 2009
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto, tão perto, tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura
Em todas as ruas te encontro
Em todas as ruas te perco
Mário Cesariny (Poema e pintura)
22 de novembro de 2009
The Saints Are Coming
(Se quiser ver o vídeo em HQ, pode ver aqui)
19 de novembro de 2009
15 de novembro de 2009
Obama e o peso do mundo
Mário Soares, em "Obama e o peso do mundo", na Visão de 12/11/2009
Texto integral na Visão online
14 de novembro de 2009
Contra a fome
E não se esqueça de divulgar. Como diria Fernando Pessoa, "É a Hora!"
9 de novembro de 2009
8 de novembro de 2009
Pai, tenho saudades
Pai, desculpa eu raramente visitar a tua sepultura, é que eu não gosto, pois eu sei que tu não estás lá. Visito-te sempre dentro de mim. Não tens estado por cá, mas mesmo assim, continuas a ajudar-me nos momentos mais difíceis.
Como gostaria de saber escrever um belo texto com belas palavras para te dedicar, mas não fui eu que herdei esse genes do lado da mãe. Tu também não eras um homem de palavras. Mas nunca, nunca mais esqueci aquelas que me escreveste nas fitas da universidade:
6 de novembro de 2009
O mais simplesmente possível
- Bom dia
antes da linguagem dos arcanjos. "
Texto integral na Visão, de ontem, online
3 de novembro de 2009
Nevoeiro
define com perfil e ser
este fulgor baço da terra
que é Portugal a entristecer –
brilho sem luz e sem arder,
como o que o fogo-fátuo encerra.
Ninguém sabe que coisa quere.
Ninguém conhece que alma tem,
nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ância distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...
É a Hora!"
Fernando Pessoa, em "Mensagem"
2 de novembro de 2009
I Gotta Feeling - come to UQAM!
31 de outubro de 2009
Terra em Miniatura
29 de outubro de 2009
Dias há
em que o teu sorriso
é uma ilha perdida dentro de mim
e o teu nome
o vento que muda as estrelas
para o dorso das andorinhas.
Dias há,
em que procuro os teus olhos
e silenciosamente te digo "meu amor",
como se eles fossem peixes
e as palavras animais estranhos
capazes de turvar a paz
das grandes profundidades."
Isabel Meyrelles
28 de outubro de 2009
26 de outubro de 2009
Estética do Artifício
(...)"
Bernardo Soares, em "O Livro do Desassossego"
Imagem: Quadro "Fernando Pessoa", de João Ricardo, óleo s/cartão, 1998
21 de outubro de 2009
I Gotta Feeling - surprise, Oprah!
19 de outubro de 2009
Não me peçam razões
Ou darei quantas queiram: bem sabemos
Que razões são palavras, todas nascem
Da mansa hipocrisia que aprendemos.
Não me peçam razões por que se entenda
A força de maré que me enche o peito,
Este estar mal no mundo e nesta lei:
Não fiz a lei e o mundo não aceito.
Não me peçam razões, ou que as desculpe,
Deste modo de amar e destruir:
Quando a noite é de mais é que amanhece
A cor de primavera que há-de vir."
José Saramago, em "Os Poemas Possíveis", 1966
18 de outubro de 2009
16 de outubro de 2009
Chicken a la Carte
15 de outubro de 2009
Alterações Climáticas (Blog Action Day )
Porque as alterações climáticas são uma realidade já incontornável. Porque imensos cientistas já chegaram à conclusão que uma boa quota parte da responsabilidade pelas alterações climáticas é devido à acção humana, que desde a revolução industrial tem aumentado progressivamente as emissões de gases com efeito de estufa para a atmosfera. Porque a sua concentração desses gases chegou até níveis demasiados perigosos para o clima. Porque em Dezembro próximo representantes da maioria dos países se vão reunir em Copenhaga para decidir sobre o sucessor do tratado de Quioto.
Porque é preciso que todos juntos procuremos fazer algo para minorar o sério problema das alterações climáticas.
E essa acção pode e deve ter duas vertentes:
- Nas nossas acções do dia-a-dia, uma atitude responsável de forma a diminuirmos o consumo de energia, água e recursos, o desperdício, o lixo produzido.
- Manifestarmo-nos publicamente de forma a pressionar os líderes mundiais a aprovarem um futuro tratado de Copenhaga justo, ambicioso e vinculativo.
10 de outubro de 2009
Arizona Dream
8 de outubro de 2009
Corrupção
"Dizem que mulher de bigode nem o diabo pode... Ando desconfiada de um cabra-macho que veio boiando desde a nascente no Maranhão até um afluente em Brasília – seu habitat. É uma espécie de marimbondo com bigode, que cospe fogo, dá até medo, ninguém pode com ele, seria então uma fêmea? Neste pântano, onde desagua todos os detritos de lavagem de dinheiro, lavagem cerebral e outras sujeiras, além deste inseto, vivem espécies de cobras venenosas, papagaios, sanguessugas e moscas brancas. Hoje, com o fenômeno desenvolvimento sustentável, eu fico preocupada com as gerações futuras, pois esses seres vivos não entrarão em extinção – um paradoxo! Mas, já que não se pode tocar no poder da natureza... seria politicamente correto abrir o local para visitação, onde todas as pessoas teriam acesso ao comportamento dos seres que se perpetuam na biodiversidade política. "
6 de outubro de 2009
Pefect Day
3 de outubro de 2009
2 de outubro de 2009
O koala e o bombeiro
30 de setembro de 2009
Imaginemos um cenário
29 de setembro de 2009
Cristalizações
26 de setembro de 2009
Campanha contra a fome - "A billion for a billion"
(Nota: este post é igual e veio de "Sustentabilidade É Acção" com a devida autorização)
25 de setembro de 2009
Voto útil?
23 de setembro de 2009
22 de setembro de 2009
Gandhi sabia!
2 - Um homem não pode fazer o certo numa área da vida, enquanto está ocupado em fazer o errado em outra. A vida é um todo indivisível.
3 - A lei de ouro do comportamento é a tolerância mútua, já que nunca pensaremos todos da mesma maneira, já que nunca veremos senão uma parte da verdade e sob ângulos diversos.
4 - Olho por olho, e o mundo acabará cego.
5 - Se queremos progredir, não devemos repetir a história, mas fazer uma história nova.
6 - Temos de nos tornar na mudança que queremos ver.
20 de setembro de 2009
Pavarotti, Bono, Módena
17 de setembro de 2009
Bosques, blogues, vícios, prémios e malmequeres
E assim recebi o prémio "O seu blog é viciante" das mãos desta fada, que pegou na varinha de condão e o transformou, como é seu costume, de um esqueleto a apodrecer, num belo ramo de malmequeres.
Obrigada querida Fada, pelo prémio, que me faz ficar vaidosa deste armazém, apesar de eu saber que é imerecido e que foi dado devido à tua bondade e amizade.
Por isso, tomo uma espécie de não decisão, e dedico este prémio a todos os blogues que estão naquela lista ali ao lado direito, onde diz "outros armazéns", mas com entrega especial de malmequeres para aqueles que visitam este armazém.
14 de setembro de 2009
Be yourself no matter what they say
11 de setembro de 2009
Perdi Meus Fantásticos Castelos
Perdi a minha taça, o meu anel,
8 de setembro de 2009
Zequinha
5 de setembro de 2009
Eu julgo, tu julgas, nós julgamos
Quando a poderosa comunicação social decide (sim, ela é que decide com o que nos devemos entreter) dar destaque a um determinado acontecimento negativo, seja crime ou não, eis que tanta gente começa a julgar. Quer dizer, não é bem só julgar: ele é advogados de defesa, é acusadores, é juízes, é um inteiro sistema judicial instituído logo no momento, que percorre num ápice o país de lés-a-lés. Arranjam-se suspeitos, acusados, réus, vítimas, testemunhas e bodes expiatórios enquanto o diabo esfrega um olho.
Entretanto, os que devem de direito investigar, defender, acusar, e julgar, continuam no seu ram-ram, mais baralhados e confusos. E alguns até gostam de entrar no jogo e dar palpites.
Com estes entretimentos todos, a verdade, das duas uma: ou se enterra num buraco tão profundo que dificilmente será descoberta, ou se desvanece em fumo para todo o sempre.
Será por isto que se diz deste país "de brandos costumes"?
4 de setembro de 2009
1 de setembro de 2009
Influências
30 de agosto de 2009
União de facto
29 de agosto de 2009
Adagio
Mas porque se trata de algo imperdível, fica aqui o link para o jovem e lindo blogue de Teresa Sá Couto, Adagio. Não podem perder esta animação de Garri Bardin, é linda, profunda, bem feita, e infelizmente retrata algo real que todos conhecemos. E o Adagio de Albinoni!
28 de agosto de 2009
Amor é bicho instruído
Olha: o amor pulou o muro
o amor subiu na árvore
em tempo de se estrepar.
Pronto, o amor se estrepou.
Daqui estou vendo o sangue
que escorre do corpo andrógino.
Essa ferida, meu bem
às vezes não sara nunca
às vezes sara amanhã."
Carlos Drummond de Andrade
25 de agosto de 2009
23 de agosto de 2009
Carta do desassossego
Estou num daqueles dias em que nunca tive futuro. Há só um presente imóvel com um muro de angústia em torno. A margem de lá do rio nunca, enquanto é a de lá, é a de cá; e é esta a razão íntima de todo o meu sofrimento. Há barcos para muitos portos, mas nenhum para a vida não doer, nem há desembarque onde se esqueça. Tudo isto aconteceu há muito tempo, mas a minha mágoa é mais antiga.
Em dias da alma como hoje eu sinto bem, em toda a minha consciência do meu corpo, que sou a criança triste em quem a vida bateu. Puseram-me a um canto de onde se ouve brincar. Sinto nas mãos o brinquedo partido que me deram por uma ironia de lata. Hoje, dia catorze de Marco, às nove horas e dez da noite, a minha vida sabe a valer isto.
No jardim que entrevejo pelas janela caladas do meu sequestro, atiraram com todos os balouços para cima dos ramos de onde pendem; estão enrolados muito alto; e assim nem a ideia de mim fugido pode, na minha imaginação, ter balouços para esquecer a hora.
Pouco mais ou menos isto, mas sem estilo, é o meu estado de alma neste momento. Como à veladora do "Marinheiro" ardem-me os olhos, de ter pensado em chorar. Dói-me a vida aos poucos, a goles, por interstícios. Tudo isto está impresso em tipo muito pequeno num livro com a brochura a descoser-se.
Se eu não estivesse escrevendo a você, teria que lhe jurar que esta carta é sincera, e que as coisas de nexo histérico que aí vão saíram espontâneas do que me sinto. Mas você sentirá bem que esta tragédia irrepresentável é de uma realidade de cabide ou de chávena - cheia de aqui e de agora, e passando-se na minha alma como o verde nas folhas.
Foi por isto que o Príncipe não reinou. Esta frase é inteiramente absurda. Mas neste momento sinto que as frases absurdas dão uma grande vontade de chorar.
Pode ser que, se não deitar hoje esta carta no correio amanhã, relendo-a, me demore a copiá-la à máquina, para inserir frases e esgares dela no LIVRO DO DESASSOSSEGO. Mas isso nada roubará à sinceridade com que a escrevo, nem à dolorosa inevitabilidade com que a sinto.
As últimas notícias são estas. Há também o estado de guerra com a Alemanha, mas já antes disso a dor fazia sofrer. Do outro lado da Vida, isto deve ser a legenda duma caricatura casual.
Isto não é bem a loucura, mas a loucura deve dar um abandono ao com que se sofre, um gozo astucioso dos solavancos da alma, não muito diferentes destes.
De que cor será sentir?
Milhares de abraços do seu, sempre muito seu,
FERNANDO PESSOA
P.S. - Escrevi esta carta de um jacto. Relendo-a, vejo que, decididamente, a copiarei amanhã, antes de lha mandar. Poucas vezes tenho tão completamente escrito o meu psiquismo, com todas as suas atitudes sentimentais e intelectuais, com toda a sua histero-neurastenia fundamental, com todas aquelas intersecções e esquinas na consciência de si-próprio que dele são tão características...
Você acha-me razão, não é verdade?"
Fernando Pessoa, em Mário de Sá-Carneiro - Cartas Escolhidas
20 de agosto de 2009
Mankind Is No Island
19 de agosto de 2009
Gente do bem
18 de agosto de 2009
17 de agosto de 2009
Esquilices londrinas
15 de agosto de 2009
Fernando Pessoa e a beleza
12 de agosto de 2009
9 de agosto de 2009
8 de agosto de 2009
Raul Solnado
6 de agosto de 2009
Um lugar
A casa, essa, feita com paredes mestras de pedra, e ainda com algumas paredes interiores de estuque, tem uma planta em forma algo invulgar em forma de P. Não é muito confortável nem funcional. Não foi feita de uma só vez, mas foi crescendo com sucessivos aumentos, à medida das necessidades das grandes famílias antigas. É uma casa rural, com algumas partes típicas, como o sequeiro, as adegas, o lagar, as eiras, e até um pombal; outras partes são o resultado de modificações posteriores, adaptando a casa a novas circunstâncias. Com tudo isto, a casa conta uma história de uma família ao longo de gerações, é só perceber a linguagem, para o que basta conhecer o modo de vida rural minhoto deste século em vias de extinção.
Algo me liga lá, seja lá o que for; sejam os tempos que lá passei, correndo pelos campos ou esfolando os joelhos de triciclo e bicicleta com os tombos naquela solarenga eira; os jogos de escondidas e os jogos de cartas com os amigos em que o meu pai também participava; ou os fins de tarde em amena cavaqueira passados no eirado, pequena eira junto ao lagar. O eirado era um dos meus lugares preferidos: rodeado de casa por todos os lados, coberto com ramada de uvas americanas, para ele se viravam as portas das frescas adegas e das outrora cortes dos bovinos residentes no rés-do-chão. No fundo, o que me ficou mais marcado foi o espaço exterior. Talvez aquele lugar seja a representação presente de outra época, uma espécie de dimensão temporal do espaço.
Não foi projectada por arquitectos. Não foi planeada com estudos teóricos. Mas ninguém lhe tira as tardes de Verão em que se faziam as malhadas ou as desfolhadas, eram tempos de trabalho duro e saudável convívio; e lembro-me vagamente de passar a tarde a fazer pequenos ramos de flores para, ao jantar, distribuir aos trabalhadores vizinhos que se juntavam e ajudavam, muitas vezes pelo sentido de comunidade, cuja paga talvez fosse apenas aquele alegre jantar.
São as memórias e sensações que tenho e que tive ligadas a um lugar, a um bocado de espaço que vivi e que vivo. E tal como uma árvore, a ele me sinto agarrada com fortes raízes invisíveis.
Talvez um dia seja possível recuperar esse canto perdido no Minho, bem perto de nós, sem ter de desenraizar as árvores.
Junho de 1999